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FOLHA ONLINE – 19/11/2008
USP testa “chá do Santo Daime” contra depressão
fonte: folha.uol

O “chá do Santo Daime”, originário da Amazônia e empregado em rituais religiosos, tornou-se a base de uma pesquisa inédita bem-sucedida da USP (Universidade de São Paulo) de Ribeirão Preto para tratar pacientes com depressão.

O projeto-piloto foi feito com duas mulheres com problemas crônicos de depressão, que tomaram uma dose do chá e relataram melhora imediata. A idéia agora é estender o estudo para 60 pacientes, com dosagens repetidas. Os pesquisadores querem descobrir se a ayahuasca –espécie de chá com efeito alucinógeno feito a partir de um cipó e um arbusto originários da Amazônia– pode substituir os antidepressivos.

Depois de a Universidade Federal de Santa Catarina fazer pesquisas com camundongos, a USP testou o chá nas duas mulheres na faixa dos 50 anos que têm sintomas como perda de apetite, desânimo e choro.

Elas tomaram 200 ml (um copo) da bebida e ficaram em observação por três dias. “No mesmo dia as pacientes já estavam melhores, e no segundo dia diziam que não estavam mais depressivas, que as cores da vida tinham voltado”, disse Jaime Eduardo Hallak, professor do Departamento de Neurociência e Ciências do Comportamento da Faculdade de Medicina da USP.

Após três dias, foi ministrado às pacientes antidepressivo comum, “porque ainda não há evidências do efeito permanente da ayahuasca”. “Mas elas acharam a experiência positiva e disseram que gostariam de tomar mais.” O médico agora aguarda nova autorização do Comitê de Ética do HC de Ribeirão para ministrar o chá a 60 pacientes em doses repetidas e em intervalos pequenos.

Na opinião de Hallak, é possível que o chá amazônico venha a se tornar uma arma contra a depressão. “Eu acredito que é possível formular um medicamento com o chá. Se não diretamente com a estrutura da molécula presente no Santo Daime, algo muito próximo.”

A ayahuasca contém duas substâncias –harmina e dimetiltriptamina. A harmina é uma espécie de antidepressivo, mas o que causa o efeito imediato é a dimetiltriptanima, que gera o equivalente a um banho de serotonina no cérebro.

O segredo do Santo Daime, diz Hallak, está na rapidez: o efeito é mais imediato, por exemplo, do que tomar um comprimido de antidepressivo.

 

O GLOBO / SAÚDE – 16/11/2008
USP de Ribeirão Preto pesquisa uso do chá de Santo Daime contra a depressão
fonte: globo.com

Duas mulheres, com problemas crônicos de depressão e que não respondiam bem ao tratamento convencional, foram as primeiras pacientes voluntárias de um estudo que vai testar a eficácia da ayahuasca – uma poção feita com o cipó Jagube e com a folha do arbusto Rainha, utilizada pelos adeptos do Santo Daime. O estudo que acompanhará, inicialmente, outros seis pacientes, é coordenado pelo professor Jaime Eduardo Cecílio Hallak, do departamento de Neurociências e Ciências do Comportamento, da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, da USP, segundo reportagem do jornal A Cidade.

– Depois desse estudo com oito voluntários, vamos propor ao comitê de ética a ampliação até 60 pacientes. Os resultados com os dois primeiros casos foram fabulosos – garante Hallak.

O professor conta que as pacientes chegaram tristes, deprimidas, sem iniciativa, desanimadas, sem apetite e com insônia.

– Demos a ayahuasca e elas ficaram em observação no hospital durante três dias, por questão de segurança.

O pesquisador conta que depois de tomarem a ayahuasca, as pacientes tiveram visões semelhantes às relatadas pelos usuários do Santo Daime. E também sensações e pensamentos de bem-estar. Essas visões e sensações duraram de 40 minutos a uma hora. E logo depois veio a boa surpresa.

– Aí fica o que chamo de efeito fabuloso: as pacientes não estavam mais tristes, nem deprimidas. De imediato, as duas senhoras, alegres, disseram que passaram a encarar a vida com novo ânimo.

Para Jaime Hallak, as sensações de alegria e bem-estar delas, que ocorreram rapidamente – equivalem ao resultado normalmente obtido com o eletrochoque – procedimento utilizado quando os demais não funcionam – mas depois de 5 a 6 sessões de aplicação.

– Nesse caso de uma dose única, cujo efeito perdura por quatro a cinco dias, é um dado importante. Como é um teste inicial, não demos as doses subseqüentes e elas voltaram ao tratamento convencional.

“Banho” de serotonina

O pesquisador afirma que a poção ayahuasca contém duas substâncias já conhecidas: uma delas é a dimetiltriptamina e a outra é a harmina.

– A harmina, por si só, já é um antidepressivo potente, mas leva de 15 a 20 dias para funcionar. Então o bem-estar imediato não é provocado por ela, mas pela dimetiltriptamina, que causa essas sensações.

Segundo o pesquisador, a substância “dá um banho” de neurotransmissor no cérebro – que é a serotonina – e o paciente tem aquelas visões e a sensação de bem estar.

– Os antidepressivos disponíveis atualmente aumentam a disponibilidade do neurotransmissor serotonina. Mas a dimetiltriptamina ‘inunda” o cérebro de serotonina e provoca de forma muito mais acentuada o mesmo efeito dos antidepressivos. Depois vem rápido o bem-estar: esse é o grande achado.

O próximo passo é delicado: será preciso começar a ajustar a posologia, determinando a dose que deve ser dada, de modo a evitar muitas visões, mas garantindo a melhoria da depressão e mantendo sempre a sensação de bem-estar.

É preciso controle médico

A ayahuasca não tem contra-indicações, mas não deve ser usada fora do controle hospitalar e médico como antidepressivo. Pode ser contra-indicada se a pessoa já estiver tomando antidepressivos, por causa de efeitos colaterais.

Além disso, a substância harmina é inibidora de uma enzima que temos no organismo a MAO – monoamina oxidase. É a mesma substância encontrada em alguns antidepressivos, que exigem do paciente uma dieta especial. Nesse caso, para consumir a ayahuasca, o paciente precisa fazer uma dieta sem banana, presunto, queijo curado, entre outros alimentos que podem interagir negativamente com a substância.

Santo Daime

Hallak, médico formado na Universidade Federal de Uberaba – mas com carreira de pesquisador feita na USP, com pós-doutorado na Inglaterra, disse que não é praticante do Santo Daime. Mas depois de manter contato com os freqüentadores da igreja de Ribeirão Preto, o Centro Fluente Luz Universal Pedro Nunes Costa, conheceu histórias de pessoas que foram dependentes de álcool e drogas e que abandonaram naturalmente o hábito.

– Dependência de drogas ou álcool está ligada a quadros depressivos. Daí veio a idéia de pesquisar a ayahuasca como antidepressivo, embora já existam estudos com outros grupos mostrando o abandono dessa dependência depois de entrar no Daime – lembra o especialista.

Paralelamente, o grupo de Ribeirão está fazendo parceria com um grupo do sul do país que estuda detalhes do mecanismo de atuação da ayahuasca em animais. Depois do término do estudo-piloto, com oito pacientes – todos voluntários- os resultados serão analisados. Para completar o grupo de 60 voluntários, será preciso localizar pacientes depressivos que não estão sendo beneficiados pelo tratamento atual e querem ajuda.

Alucinógeno

O Santo Daime, enquadrado como alucinógeno, não causa dependência. Mas o consumo é liberado pelo Ministério da Saúde apenas para uso religioso. Já o Ministério da Cultura, ainda na gestão Gilberto Gil, transformou o Santo Daime em patrimônio histórico nacional.

Jaime Cecílio Hallak observou que todas as pessoas que tomam ayahuasca – seja na igreja ou no laboratório – têm as mesmas visões simbólicas ligadas a questões da natureza, com imagens de espíritos e seres da floresta.

– A pessoa não perde a consciência nem o controle e sabe que está tendo as visões.

Doença já é a quarta causa de incapacitação no mundo

Em 2020 a depressão será a segunda causa de incapacitação no mundo, segundo previsão da Organização Mundial da Saúde.

Hoje é a quarta causa – lembra o psiquiatra Silvio Luiz Moraes, chefe da equipe da Enfermaria de Psiquiatria do HC de Ribeirão Preto.

Ele admite que tem ocorrido mais casos da doença e que aumentou o número dos pacientes refratários aos tratamentos convencionais.

Jaime Hallak acredita que os critérios em diagnóstico melhoraram muito. Mas também existem evidências de que está aumentando o número de casos de depressão, por questões psicológicas da sociedade moderna.

E comemora que diminuiu o preconceito.

– Só da gente conversar sobre depressão para um jornal, mostra que as pessoas não têm mais vergonha de falar que vão a um psiquiatra. Hoje até parece que é status: eu vou lá no meu psiquiatra. Um dia estava conversando com um rapaz e ele falou: “tenho meus dois médicos, meu psiquiatra e meu terapeuta”.

Múltiplas causas

As causas das doenças psiquiátricas são consideradas multicausais.

– A pessoa pode ter uma predisposição genética, mas não é suficiente para determinar que a pessoa ou o filho dela terá depressão. Mas aumenta a chance desse filho ter o problema em comparação com o filho de uma pessoa que não tem depressão. Mas só isso não é suficiente para explicar- disse.

Segundo o pesquisador, é preciso a ocorrência de eventos na vida da pessoa “que propiciem essa carga genética de se expressar. E essa expressão dessa carga genética, significa que você tem um desequilíbrio bioquímico”.

Mas não é só ele: por isso, tratar depressão não é só dar remédio, diz o médico. “Acho imprescindível, além do tratamento medicamentoso ou biológico, fazer o acompanhamento psicoterápico.”

Doença crônica

A depressão é uma doença crônica: antigamente se acreditava que ocorreriam apenas episódios.

– Hoje em dia, pode ter gente que não concorda com essa visão, acredito que a depressão é recorrente. Quem teve um episódio, tem chance grande de ter um segundo episódio. Quem teve um segundo, quase certamente terá um terceiro; quem teve um terceiro, certamente terá um quarto episódio; cada episódio aumenta o risco: isso é biológico, não é psicológico. Por isso também não posso tratar depressão só com psicoterapia. Tem que tomar as medicações e fazer os tratamentos biológicos, afirmou o pesquisador Jaime Cecílio Hallak.